"Número Zero", novo romance do escritor italiano, é
ambientado em 1992 e mostra a história de um jornal criado para difamar
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Umberto Eco fala sobre jornalismo em seu novo livro
(Foto) Aubrey / Wikimedia Commons
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Por Kelly Velázquez (AFP)
O famoso escritor e ensaísta italiano Umberto Eco apresentou nesta
semana na Itália seu novo romance, Número zero, uma espécie de manual do mau
jornalismo ambientado na redação de um jornal imaginário.
O novo livro do influente intelectual italiano, autor do famoso
romance O nome da rosa e de importantes tratados de semiótica, é uma história
de ficção ambientada em 1992, um ano particular para a Itália contemporânea,
marcado pelos escândalos de corrupção e pela investigação "Mani
Pulite" (Mãos limpas), que arrasou com boa parte da classe política da
época.
O livro se concentra, sobretudo, nos mistérios não resolvidos que
sacudiram nestes anos a Itália, entre eles o protagonizado pela loja maçônica
Propaganda 2 do temido Licio Gelli, que queria dar um "golpe branco".
"É o primeiro romance de Eco que fala de uma época tão recente",
reconhece Elisabetta Sgarbi, diretora da editora Bompiani.
Eco descreve a redação imaginária de um jornal, criado naquele ano,
para desinformar, difamar adversários, chantagear, manipular, elaborar dossiês
e documentação secreta. "Para mim é um manual da comunicação de nossos
dias", sustenta Roberto Saviano, renomado jornalista antimáfia da Itália,
que vive sob escolta pelas ameaças de morte que recebe das organizações
criminosas.
Em uma conversa entre Eco e Saviano, publicada pela revista
L'Espresso, o semiólogo afirma que não quis escrever um "tratado de
jornalismo", mas contar uma história sobre os limites da informação, sobre
como funciona uma máquina de denegrir, e não tanto sobre o trabalho de
informar. "Escolhi o pior caso. Quis dar uma imagem grotesca do mundo,
ainda que o mecanismo da máquina para sujar, de lançar insinuações, já fosse
usado durante a Inquisição", comentou Eco.
Saviano, que considera que as redes sociais multiplicaram esta forma
de denegrir gerando verdadeiros monstros, acredita que o magnata das
comunicações e ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi marcou o início dessa
era, entre boatos e informações, vida e vícios tanto privados quanto públicos. "Escolhi
1992 porque considero que este ano marca o momento de um declínio na história
da sociedade italiana", disse Eco em uma entrevista ao Corriere della
Sera.
No livro, o semiólogo se diverte citando frases famosas ou lugares
comuns do jornalismo, como "no olho do furacão", "um duro
revés" ou "com a água no pescoço". "Não é necessário
estrangular a avó para perder a credibilidade. É suficiente contar que o juiz
usa meias na cor laranja. Por que será?", contou Eco citando um caso
verdadeiro durante uma longa entrevista à RAI.
Graças aos delírios de um redator paranoico, Eco conta fatos
concretos, mas reconstruídos a partir de teorias bizarras ou que se entrelaçam
estranhamente com outras e que terminam por criar uma nova notícia.
É o caso da loja maçônica P2, do suposto assassinato do papa Luciani
(João Paulo I), dos cúmplices das brigadas vermelhas que trabalhavam para os
serviços secretos, dos tentáculos da CIA, dos atentados e até de um falso
cadáver de Benito Mussolini com o qual conseguiram salvá-lo e enviá-lo à
Argentina. Todas são histórias que o leitor não conseguirá determinar se são
fatos inventados ou a descrição da realidade, segundo o escritor.
Trata-se do sétimo romance de Eco, que publicou, entre outros, O
Cemitério de Praga e O Pêndulo de Foucault.
Fonte: Carta Capital