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quinta-feira, 18 de junho de 2015

Comunicação e literatura: Umberto Eco e o manual do mau jornalismo

"Número Zero", novo romance do escritor italiano, é ambientado em 1992 e mostra a história de um jornal criado para difamar

Umberto Eco fala sobre jornalismo em seu novo livro
(Foto) Aubrey / Wikimedia Commons
Por Kelly Velázquez (AFP)

O famoso escritor e ensaísta italiano Umberto Eco apresentou nesta semana na Itália seu novo romance, Número zero, uma espécie de manual do mau jornalismo ambientado na redação de um jornal imaginário.

O novo livro do influente intelectual italiano, autor do famoso romance O nome da rosa e de importantes tratados de semiótica, é uma história de ficção ambientada em 1992, um ano particular para a Itália contemporânea, marcado pelos escândalos de corrupção e pela investigação "Mani Pulite" (Mãos limpas), que arrasou com boa parte da classe política da época.

O livro se concentra, sobretudo, nos mistérios não resolvidos que sacudiram nestes anos a Itália, entre eles o protagonizado pela loja maçônica Propaganda 2 do temido Licio Gelli, que queria dar um "golpe branco". "É o primeiro romance de Eco que fala de uma época tão recente", reconhece Elisabetta Sgarbi, diretora da editora Bompiani.

Eco descreve a redação imaginária de um jornal, criado naquele ano, para desinformar, difamar adversários, chantagear, manipular, elaborar dossiês e documentação secreta. "Para mim é um manual da comunicação de nossos dias", sustenta Roberto Saviano, renomado jornalista antimáfia da Itália, que vive sob escolta pelas ameaças de morte que recebe das organizações criminosas.

Em uma conversa entre Eco e Saviano, publicada pela revista L'Espresso, o semiólogo afirma que não quis escrever um "tratado de jornalismo", mas contar uma história sobre os limites da informação, sobre como funciona uma máquina de denegrir, e não tanto sobre o trabalho de informar. "Escolhi o pior caso. Quis dar uma imagem grotesca do mundo, ainda que o mecanismo da máquina para sujar, de lançar insinuações, já fosse usado durante a Inquisição", comentou Eco.

Saviano, que considera que as redes sociais multiplicaram esta forma de denegrir gerando verdadeiros monstros, acredita que o magnata das comunicações e ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi marcou o início dessa era, entre boatos e informações, vida e vícios tanto privados quanto públicos. "Escolhi 1992 porque considero que este ano marca o momento de um declínio na história da sociedade italiana", disse Eco em uma entrevista ao Corriere della Sera.

No livro, o semiólogo se diverte citando frases famosas ou lugares comuns do jornalismo, como "no olho do furacão", "um duro revés" ou "com a água no pescoço". "Não é necessário estrangular a avó para perder a credibilidade. É suficiente contar que o juiz usa meias na cor laranja. Por que será?", contou Eco citando um caso verdadeiro durante uma longa entrevista à RAI.

Graças aos delírios de um redator paranoico, Eco conta fatos concretos, mas reconstruídos a partir de teorias bizarras ou que se entrelaçam estranhamente com outras e que terminam por criar uma nova notícia.

É o caso da loja maçônica P2, do suposto assassinato do papa Luciani (João Paulo I), dos cúmplices das brigadas vermelhas que trabalhavam para os serviços secretos, dos tentáculos da CIA, dos atentados e até de um falso cadáver de Benito Mussolini com o qual conseguiram salvá-lo e enviá-lo à Argentina. Todas são histórias que o leitor não conseguirá determinar se são fatos inventados ou a descrição da realidade, segundo o escritor.

Trata-se do sétimo romance de Eco, que publicou, entre outros, O Cemitério de Praga e O Pêndulo de Foucault.




sábado, 25 de janeiro de 2014

Mídia & ensino superior: na Botucúndia, nem Galileo escapa da desmoralização

Por Alberto Dines*
    
A grande mídia tem muito a ver com a débâcle da Universidade Gama Filho e da UniverCidade, no Rio. O ensino superior privado é um fabuloso negócio. Prova disso é o tamanho da dívida do Grupo Galileo, mantenedor de ambas: 900 milhões de reais. Cerca de 400 milhões de dólares – padrão Fifa, coisa de gente grande.

(Foto Divulgação Internet)

Quantas advertências e denúncias contra arapucas universitárias apareceram em nossa imprensa ultimamente? No País dos Bacharéis é temerário colocar sob suspeita a fabricação de doutores. Grande parte dos ministros do STF ganha ricos pro-labores para dar aulas-magnas e conferências. A ninguém incomoda este ostensivo conflito de interesses.

Em suas edições da segunda-feira (20/1), dia normalmente fraco em publicidade, os dois jornalões paulistanos não tinham de que se queixar. Na Folha S.Paulo a Universidade Nove de Julho (Uninove, Sempre 10!), a FMU e a Faculdade Impacto compraram respectivamente uma página, meia página e um quarto de página para vender seus produtos no segmento de pós-graduação. Nesse mesmo dia, no Estado de S.Paulo, a Uninove comprou um grande rodapé na capa e uma página inteira no primeiro caderno, ambos dirigidos ao mesmo mercado.

O lobby do ensino superior privado foi sempre um bom freguês dos “cadernos de serviço”, “informes publicitários” e matérias pagas disfarçadas exaltando a qualidade da nascente indústria do diploma.

A mídia brasileira é unânime ao proclamar a necessidade de uma revolução em nossas universidades – cruzada legítima, vital para implementar nossos padrões de competitividade. Porém, à sombra das boas causas sempre viceja algum tipo de gangsterismo. Aqui, os pactos corporativos não permitem a separar o joio do trigo, se um jornal flagra as trapaças de uma universidade privada o segmento inteiro o boicota. O jornalista que ousa devassar as espúrias conexões entre políticos, acadêmicos e fabricantes de diplomas está ferrado. Tem peixe muito graúdo nesse balaio. O credenciamento de universidades sempre rendeu fabulosas propinas.

Fundos de pensão
A história desta aberração gramatical e educacional chamada UniverCidade começou com o “buraco da Delfin”, em 1983, nos estertores da ditadura, o primeiro grande escândalo financeiro da era moderna no Brasil. Ronald Levinsohn, o dono da financeira, não perdeu um tostão: manteve a sua magnífica cobertura em frente ao Central Park em Nova York e, para branquear seu currículo, comprou a Faculdade da Cidade e a transformou na UniverCidade (neste Observatório alcunhada de Univer$idade), onde desenvolvia sem fiscalização os delírios tirânicos e idiossincrasias fascistóides (ver “UniverCidade ou Univer$idade”).

Passou o abacaxi ao Grupo Galileo, que já estava com outro, mais apetitoso, a Universidade Gama Filho, com 70 anos de vida, antigo Colégio Piedade, um dos melhores da antiga Capital Federal – quase 30 mil alunos pagando religiosamente suas mensalidades. A meta no curto prazo era comprar outros abacaxis e alcançar um universo de 100 mil alunos.

O acionista majoritário do Grupo Galileo Educacional é o pastor Adenor Gonçalves dos Santos. Artífice da montagem do conglomerado, o advogado Márcio André Mendes Costa ficou com a presidência e convocou a TOTVS, especializada em soluções de informática e gestão de empresas de ensino superior, para montar a operação, apresentada em seu porfólio como um dos seus cases de sucesso.

Não foi fácil: as duas universidades são entidades sem fins lucrativos, os antigos mantenedores precisavam ser reembolsados, os 100 milhões de reais em debêntures subscritos pelos fundos de pensão Petros (da Petrobras) e Postalis (Correios) destinados a sanear a Gama Filho foram utilizados para pagar a compra da UniverCidade, a patranha logo seria descoberta

Negócios suspeitos
E foi: a CPI do Ensino Superior criada na Assembleia Legislativa do Estado do Rio denunciou o grupo, os responsáveis foram acusado de um monte de malfeitorias, inclusive lavagem de dinheiro. O noticiário não teve destaque, a greve dos professores e funcionários não repercutiu, nem os sucessivos protestos dos alunos. A ninguém interessava criar um caso nacional. Sobretudo aos lobistas do ensino superior que ganham comissões, escrevem nos jornais e não querem que o seu negócio fique sob suspeita.

Pobre Galileo Galilei: na Itália, o astrônomo foi condenado pela ignorância e pela Inquisição; no Brasil, denunciado por formação de quadrilha.




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