Por Alberto Dines*
A grande mídia tem muito a ver com a débâcle da Universidade Gama
Filho e da UniverCidade, no Rio. O ensino superior privado é um fabuloso
negócio. Prova disso é o tamanho da dívida do Grupo Galileo, mantenedor de
ambas: 900 milhões de reais. Cerca de 400 milhões de dólares – padrão Fifa,
coisa de gente grande.
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(Foto Divulgação Internet) |
Quantas advertências e denúncias contra arapucas universitárias
apareceram em nossa imprensa ultimamente? No País dos Bacharéis é temerário
colocar sob suspeita a fabricação de doutores. Grande parte dos ministros do
STF ganha ricos pro-labores para dar aulas-magnas e conferências. A ninguém
incomoda este ostensivo conflito de interesses.
Em suas edições da segunda-feira (20/1), dia normalmente fraco em
publicidade, os dois jornalões paulistanos não tinham de que se queixar. Na
Folha S.Paulo a Universidade Nove de Julho (Uninove, Sempre 10!), a FMU e a
Faculdade Impacto compraram respectivamente uma página, meia página e um quarto
de página para vender seus produtos no segmento de pós-graduação. Nesse mesmo
dia, no Estado de S.Paulo, a Uninove comprou um grande rodapé na capa e uma
página inteira no primeiro caderno, ambos dirigidos ao mesmo mercado.
O lobby do ensino superior privado foi sempre um bom freguês dos
“cadernos de serviço”, “informes publicitários” e matérias pagas disfarçadas
exaltando a qualidade da nascente indústria do diploma.
A mídia brasileira é unânime ao proclamar a necessidade de uma
revolução em nossas universidades – cruzada legítima, vital para implementar
nossos padrões de competitividade. Porém, à sombra das boas causas sempre
viceja algum tipo de gangsterismo. Aqui, os pactos corporativos não permitem a
separar o joio do trigo, se um jornal flagra as trapaças de uma universidade
privada o segmento inteiro o boicota. O jornalista que ousa devassar as
espúrias conexões entre políticos, acadêmicos e fabricantes de diplomas está
ferrado. Tem peixe muito graúdo nesse balaio. O credenciamento de universidades
sempre rendeu fabulosas propinas.
Fundos de pensão
A história desta aberração gramatical e educacional chamada
UniverCidade começou com o “buraco da Delfin”, em 1983, nos estertores da
ditadura, o primeiro grande escândalo financeiro da era moderna no Brasil.
Ronald Levinsohn, o dono da financeira, não perdeu um tostão: manteve a sua
magnífica cobertura em frente ao Central Park em Nova York e, para branquear
seu currículo, comprou a Faculdade da Cidade e a transformou na UniverCidade
(neste Observatório alcunhada de Univer$idade), onde desenvolvia sem
fiscalização os delírios tirânicos e idiossincrasias fascistóides (ver
“UniverCidade ou Univer$idade”).
Passou o abacaxi ao Grupo Galileo, que já estava com outro, mais
apetitoso, a Universidade Gama Filho, com 70 anos de vida, antigo Colégio
Piedade, um dos melhores da antiga Capital Federal – quase 30 mil alunos
pagando religiosamente suas mensalidades. A meta no curto prazo era comprar
outros abacaxis e alcançar um universo de 100 mil alunos.
O acionista majoritário do Grupo Galileo Educacional é o pastor Adenor
Gonçalves dos Santos. Artífice da montagem do conglomerado, o advogado Márcio
André Mendes Costa ficou com a presidência e convocou a TOTVS, especializada em
soluções de informática e gestão de empresas de ensino superior, para montar a
operação, apresentada em seu porfólio como um dos seus cases de sucesso.
Não foi fácil: as duas universidades são entidades sem fins
lucrativos, os antigos mantenedores precisavam ser reembolsados, os 100 milhões
de reais em debêntures subscritos pelos fundos de pensão Petros (da Petrobras)
e Postalis (Correios) destinados a sanear a Gama Filho foram utilizados para
pagar a compra da UniverCidade, a patranha logo seria descoberta
Negócios
suspeitos
E foi: a CPI do Ensino Superior criada na Assembleia Legislativa do
Estado do Rio denunciou o grupo, os responsáveis foram acusado de um monte de
malfeitorias, inclusive lavagem de dinheiro. O noticiário não teve destaque, a
greve dos professores e funcionários não repercutiu, nem os sucessivos
protestos dos alunos. A ninguém interessava criar um caso nacional. Sobretudo
aos lobistas do ensino superior que ganham comissões, escrevem nos jornais e
não querem que o seu negócio fique sob suspeita.
Pobre Galileo Galilei: na Itália, o astrônomo foi condenado pela
ignorância e pela Inquisição; no Brasil, denunciado por formação de quadrilha.
*Publicado no Observatório
da Imprensa