Acabo de ler nos jornais uma pesquisa
feita entre os professores do ensino fundamental e médio num dos países
europeus classificado entre os que têm o melhor ensino do mundo. Pois bem,
constata-se carência catastrófica de cultura geral e de conhecimentos prontos.
Não conhecem seu conterrâneo que é presidente da União Europeia, não conhecem
os candidatos para as eleições nacionais, nem os programas dos partidos. Não
conhecem a história de seu país, nem suas lutas nacionais e sociais.
Parecem
semelhantes àquele presidente de um grande país norte-americano que chamou Buenos
Aires de capital do Brasil... Pois é, não é só no Brasil... Mas que isso não
seja um consolo para os brasileiros, e sim uma razão de tristeza redobrada!
Pois essa mentalidade é importada também aqui.
A cultura geral desses agentes da
educação não ultrapassa o nível do balcão do bar ou do jornalismo mais chão,
digamos, do noticiário das oito da noite na televisão.
Mais que este fenômeno, bastante
conhecido, interessa-nos a causa disso. Uma é a substituição da memória interna
da pessoa pela memória externa: os meios de comunicação, a internet... Para o
que não sabem, podem remeter à internet. Isso é até certo ponto inevitável,
pois hoje tem-se acesso a tantas informações que seria impossível registrá-las
na cabeça. Ainda assim, seria bom registrar pelo menos aquelas que são
fundamentais e relevantes para operar com elas nas situações do dia a dia e nos
desafios da vida como tal.
Outra razão que se aponta é o tipo de
ensino que prevalece: ensino a partir da realidade. Está certo... mas a
realidade de interesse dos alunos não é a realidade toda. É muito limitada. Se
o professor não tiver muita criatividade e conhecimento geral, não conseguirá
abrir o mundo de seus alunos, nem o seu. Tem-se um construtivismo superficial,
alienado e alienante, não aquele que Piaget sonhou, e muito menos aquele que
Paulo Freire elaborou para conscientizar o povo.
Há também o fato de que, apesar do
propalado ensino a partir da observação, essa ‘observação’ já vem empacotada na
forma de material didático pré-fabricado, o qual, à diferença dos antigos
manuais escolares, dificilmente incute nos alunos uma visão abrangente e
sistematizada do respectivo campo do saber. Muito menos, do conjunto do saber.
O material didático já traz o espírito do consumo, até quando fala da ecologia.
Reforçando o que se vendo no comércio.
E ainda: a depreciação da profissão do
ensinante (pelo menos no ensino fundamental e até no médio). Depreciação
salarial (lá menos que no Brasil), mas sobretudo depreciação social. Qual a
moça que apresenta seu namorado como professor do Ensino Fundamental? Dirá, no
mínimo, que está pretendo entrar no mestrado...
Com isso se relaciona a questão do
ambiente social tanto dos professores como dos alunos. Se, sobretudo na escola
pública, os alunos vêm de ambientes carentes (na Europa, por exemplo, os
imigrantes; aqui, a população das periferias desestruturadas), grande é a
chance que os próprios professores participem da precariedade da situação em
que trabalham.
Está na hora de fazer, novamente e de
modo novo, aquilo que se fez no tempo da Renascença: criar uma tradição de
saberes que permita às pessoas situar-se no seu mundo e, até, entrever um
horizonte que deixe transparecer aquilo que o transcende.
Para tanto é preciso trabalhar nas duas
extremidades da corrente: na formação dos formadores e na reforma da escola.
Pois professores bem-formados precisam encontrar um ambiente de atuação em que
sua formação possa render, produzir mais que a conhecida frustração. E, por
outro lado, devem ter um formação e riqueza pessoa que seja capaz de transmitir
algo superior.
*Konings nasceu na Bélgica, em 1941, onde
se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao
Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote
diocesano, em 1972. Foi professor de exegese bíblica na Pontifícia Universidade
Católica de Porto Alegre (1972-82) e na do Rio de Janeiro (1984). Em 1985,
entrou na Companhia de Jesus (jesuítas) e, desde 1986, atua como professor de
exegese bíblica na Faje - Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo
Horizonte, onde recebeu o título de Professor Emérito em 2011. Participou da
fundação da Escola Superior Dom Helder Câmara.
Fonte domtotal.com