A pedagoga Inês Kisil Misdalo (foto), que coordena a área
de Educação Formal do Instituto Ayrton Sena, afirmou que o sistema educacional
brasileiro contribui para o crescimento do trabalho infantil.
"À medida
que a qualidade da educação deixa a desejar, colocamos na sociedade a
possibilidade da exploração infantil", alertou durante apresentação no
painel Experiências de inclusão social de crianças e adolescentes pela Educação.
A questão foi debatida durante o Seminário Trabalho Infantil, Aprendizagem e
Justiça do Trabalho.
O evento, realizado pelo Conselho Superior da
Justiça do Trabalho e pelo Tribunal Superior do Trabalho, reúne nesta semana (9
a 11/10/2012), em Brasília, autoridades do executivo, legislativo e judiciário,
acadêmicos e organizações não governamentais para propor novos rumos na luta contra a
exploração de milhares de crianças e adolescentes brasileiros.
Inês Kisil destacou que, embora 98% das crianças
estejam na escola, cerca de 3,5 milhões são reprovadas anualmente. O problema não
seria de oferta, mas da qualidade que não mantém as crianças na escola.
Mostrou-se preocupada com a evasão no ensino médio, que chega a 40%, em uma
faixa etária onde ocorre o começo da vida profissional para muitos desses
adolescentes.
Ela relatou experiências do Instituto Ayrton Senna
no treinamento dos adultos que têm contato direito com as crianças. Ela
criticou a falta de planejamento na Educação do país e a qualidade das nossas
escolas públicas, ainda voltadas para o século XX e XIX, pouco atraentes para
os jovens de hoje.
Erradicação
do trabalho infantil pela educação
A cientista social Patrícia Mara Santin, gerente
da área da infância e da adolescência da Fundação Telefônica, ligada à Vivo,
disse hoje no Seminário que a sociedade não tem o entendimento de que o
trabalho infantil "é um problema da nossa conta", que precisa e pode
ser resolvido pela Educação ampla, com o auxílio de parcerias.
A própria falta de consenso sobre o que é trabalho
infantil tem levado as pessoas que trabalham na área a identificar
equivocadamente quais crianças realmente necessitam de atendimento, manifestou
a palestrante. Preocupada com essa questão, ela informou que a sua organização
utiliza um modelo de diagnóstico rápido desenvolvido pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT), que possibilita, inclusive, a identificação de
trabalho infantil doméstico, que é invisível na sociedade.
Para Patrícia Santin, os alarmantes números
oficiais que dimensionam o trabalho infantil no Brasil são apenas a ponta do
iceberg, porque a experiência tem demonstrado que os problemas são muito
maiores. Na sua opinião, os municípios não veem conseguindo articular
adequadamente o papel dos conselhos de direitos, como o tutelar, compreendidos
no Sistema Único de Assistência Social, coordenado pelo Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. "A fundação trabalha no sentido
de que esse sistema funcione na prática", disse Patrícia Santin.
Fundação
Gol de Letra propõe educação articulada e integral
O representante da Fundação Gol de Letra, Felipe
Pitaro, defendeu, em sua participação no painel, o desenvolvimento de ações
articuladas voltadas para a formação integral de crianças e jovens. "O
fracasso do sistema educacional reside, em parte, na expectativa de que o
Estado e a iniciativa privada façam toda a ação de transformação",
afirmou.
A fundação, criada em 1998 pelos jogadores de
futebol Raí e Leonardo, desenvolve diversos programas voltados para a
transformação social por meio da educação, com ênfase no desenvolvimento de
valores como dignidade, solidariedade, perseverança e fraternidade, e, por meio
de parcerias com empresas, promove a inserção de jovens no mercado de trabalho.
Os programas atendem cerca de 1.600 crianças diretamente, além de suas
famílias.
Pitaro, que é professor da rede estadual do Rio de
Janeiro, afirma que a articulação com o Estado, ainda frágil, precisa ser
fortalecida para que a Educação mude de um processo de disciplina e rendimento
para um de construção de cultura e ação social legítima. "Educação é um
ato voluntário, e a estrutura física e a grade curricular não garantem a Educação",
defende. O processo, conclui, precisa fazer sentido para o educando, gerar
modelos e criar um cenário de envolvimento.