Quando se ouve dizer que um grupo de
escolas na Califórnia, chamado genericamente de HTH (High Tech High), capturou
a atenção de pessoas como Barack Obama, Oprah Winfrey e Bill Gates, a primeira
coisa que se pode pensar é que elas devem se destacar por ter tudo o que de
mais moderno pode haver em salas de aula. Até é, mas não só.
A proposta dessa rede, que começou em
2000 e hoje [dezembro de 2012] é formada por 11 escolas e uma instituição de
pós-graduação para professores, se baseia em quatro pilares que têm sido
apontados por especialistas em Educação como essenciais para formar alunos para
o século 21: personalização, conexão com o mundo, interesse comum em aprender e
professor como designer do aprendizado.
“Nós temos computadores em todas as salas
e excelentes laboratórios, mas nosso diferencial não está aí”, diz Robert Khul,
diretor de uma das unidades, a HTH Media Arts. O primeiro passo, afirma o
educador, está no processo de admissão. Por serem charters, escolas públicas de
administração privada, elas são gratuitas para todos os seus cerca de 4.500
alunos.
Atividades das escolas HTH, em San Diego (Fotos Divulgação) |
No entanto, pelos bons resultados que a
escola vem acumulando – em 2011, por exemplo, 100% dos alunos foram aceitos em
uma universidade – há mais candidatos do que as escolas são capazes de receber.
São duas unidades de fundamental 1, quatro de fundamental 2 e cinco de ensino
médio, todas muito procuradas.
A solução que a direção encontrou foi
fazer um sorteio respeitando um critério que procura atender a todas as áreas
da região onde as escolas estão. Assim, afirma Kuhl, a escola garante que seu
corpo de alunos seja bem diverso e integre classes sociais diferentes. “Aqui
nós temos filhos de milionários e filhos de pessoas que não têm onde morar”,
diz.
Outro fator que explica o sucesso da
escola, defende o diretor, é a aposta na personalização, baseada tanto no
contato direto entre professores e alunos quanto em recursos virtuais.
“Mantemos uma proporção baixa de alunos por professor”, diz Kuhl. Além disso, a
cada aluno da HTH é designado um monitor, que se torna responsável por fazer um
acompanhamento individualizado de interesses acadêmicos específicos. Com tal
integração entre alunos e professores, as partes se sentem corresponsáveis pelo
processo de aprendizagem e cumprem o segundo dos pilares da escola: interesse
comum em aprender. No mundo virtual, os alunos são estimulados a manterem suas
produções em um portfólio digital, acessível a qualquer um.
Nesse sistema de relações, a presença de
professores qualificados é fundamental. Por isso, a escola percebeu a
necessidade de ter sua instituição de ensino superior para formar e atualizar
seus profissionais. “A missão da HTH Graduate School of Education é preparar
líderes reflexivos, capazes de desenvolver ambientes de aprendizagem
inovadores, autênticos e rigorosos”, diz a instituição em seu site. É ali,
dividindo espaço físico com as escolas, que o contato com a prática ocorre e os
professores aprendem, reaprendem e reciclam métodos.
Sem livros-texto pré-determinados, são
eles os responsáveis por guiar o aluno, o que é o quarto dos pilares da HTH.
“Nós somos atentos, mas não escravos do currículo nacional”, diz Kuhl. Assim,
explica ele, a escola sugere que, em vez de blocos de 50 minutos, as aulas
sejam mais longas, facilitando o desenvolvimento do aprendizado baseado em
projetos. E algumas disciplinas são agrupadas “porque é assim que elas vão
aparecer na vida”, diz Kuhl, reforçando mais um dos pilares da escola, a
conexão com o mundo lá fora.
Por isso, matemática e física costumam
ser ensinadas juntas para alunos do ensino médio. Isso também ocorre com a
disciplina de humanidades, que reúne história, filosofia e língua inglesa. Até
fisicamente a escola foi pensada para facilitar os arranjos diferentes das
salas de aula tradicionais, com espaços para atividades manuais, para reunião
de grupos pequenos, para trabalhos individuais e para apresentações.
Mostrar aos pares o que se está
produzindo, aliás, é mais um dos estímulos constantes que a escola se preocupa
em fazer. Mais do que apenas apresentar os projetos, a ideia é passar a
mensagem de que estão fazendo coisas relevantes e que podem interessar a quem
quer que esteja passando. Não por acaso, a arquitetura dos prédios – nos mais
recentes, pelo menos, já que os mais antigos ocuparam e adaptaram edifícios que
já existiam – é repleta de luz natural e paredes de vidro. “O aluno não pode
ter vergonha do que está produzindo”, diz Kuhl.
Os alunos precisam mesmo se acostumar com
o assédio e a curiosidade externa. A escola é aberta a tours, que podem ser
feitos por qualquer um que se inscreva pelo site. Oprah Winfrey e Bill Gates,
cuja fundação financia parte dos projetos, já estiveram por lá. Barack Obama
não foi, mas foi por um triz. A HTH foi uma das três finalistas em um concurso
no ano passado que tinha como premiação a visita do presidente no dia da
formatura do ensino médio, mas acabou perdendo para uma escola do Tennessee.
E não são só as celebridades que vão ver
com os próprios olhos o projeto da escola. Segundo Kuhl, já passaram por
aqueles corredores pessoas de todos os estados dos EUA e dos mais diversos
países: Singapura, Israel, Canadá, Suécia, interessados em replicar o que vem
sendo feito em seus lugares de origem.
“Eles sempre me falam uma lista de
motivos para justificar que o que fazemos é impossível de ser aplicado em suas
realidades. Nossa sugestão, para eles, é sempre a mesma: então tentem descobrir
o que dá para fazer”, afirma o diretor. Para ele, com o tempo, cada educador
vai descobrir que, mesmo em legislações e sistemas rígidos, é possível
flexibilizar.
A intenção dos fundadores da primeira HTH
era ter um modelo bem-sucedido de escola que pudesse ser usado em outros
lugares e, de alguma forma, melhorasse o aprendizado. Douze anos e 11 escolas
depois, parece que o caminho já começou a ser trilhado. E de onde será que veio
a inspiração para tudo isso? Do construtivismo de Paulo Freire, responde Kuhl.
Fonte Portal Porvir