Por Thomaz Wood Jr.
Aprender é mais do que absorver
conhecimentos, é ser capaz de pensar criticamente sobre o mundo ao redor
Liberal Arts é um filme norte-americano
de produção independente, escrito, dirigido e estrelado por Josh Radnor. Conta
a história de Jesse, um amante de livros desencantado com sua vida pessoal e
entediado com seu trabalho. No início do filme, Jesse é convidado a visitar a
faculdade onde estudou, uma escola de artes e humanidades, para homenagear um
antigo mestre que está se aposentando.
A visita desdobra-se em uma relação
epistolar com uma estudante de teatro, uma aventura com uma antiga e desiludida
professora e o contato com um brilhante e depressivo estudante de literatura. A
experiência tem efeito redentor sobre Jesse. Além das tramas afetivas, o filme
é uma ode ao ensino de artes e ao papel da poesia, da literatura e do teatro na
construção da experiência humana.
Em texto publicado no fim de maio no The
New York Times, Gary Gutting, professor de filosofia da Universidade de
Notre-Dame, faz eco a Liberal Arts, ao refletir sobre a experiência do
aprendizado nas universidades. Gutting parte de uma perspectiva crítica:
segundo ele, a Educação superior parece fundar-se na tarefa de fazer com que os
pupilos absorvam um corpo complexo de conhecimentos rapidamente, somente para
realizar exames e, em seguida, esquecê-los quase por completo.
O filósofo argumenta que tanto para
conhecimentos básicos e corriqueiros, como ler, escrever e fazer contas, quanto
para conhecimentos mais sofisticados, aqueles necessários para projetar aviões
ou realizar cirurgias, o que garante o verdadeiro aprendizado é a curiosidade e
a prática. Conseguimos lidar com nossas contas e exercer uma profissão
especializada porque constantemente aplicamos o conhecimento necessário para
realizar tais operações e atividades. O que aprendemos e não utilizamos é quase
sempre esquecido.
Gutting argumenta que os cursos
superiores deveriam deixar de centrar-se na transmissão de conhecimento por si
e engajar os estudantes em “exercícios intelectuais”. O autor cita o exemplo de
seu próprio curso, no qual explora com os estudantes obras de Platão, Calvino e
Nabokov. O objetivo é simplesmente colocar os pupilos em contato com grandes
textos. O que se ganha não é verniz cultural, mas o prazer de explorar caminhos
intelectuais e estéticos, de ampliar a visão do mundo e da natureza humana.
Para o filósofo, a educação universitária
pode ser o espaço do explorador. O ensino, para ele, não deveria ser avaliado
pela quantidade de informações transmitidas e assimiladas, mas pela
possibilidade de estimular uma atitude de abertura a novos conhecimentos e pela
capacidade de assimilar novas ideias provocadas nos estudantes. O conhecimento
que vem do uso e da prática é o produto final de uma semente plantada na
escola.
Naturalmente, as sociedades necessitam de
profissionais tecnicamente qualificados, capazes de preencher as vagas nas
empresas e desempenhar suas tarefas. Profissões como a medicina, a
administração, a engenharia e a advocacia exigem o domínio de grandes corpos de
conhecimento. Entretanto, o simples domínio desse saber não torna o detentor
capaz de exercer uma profissão. Empresas e outras organizações exigem cada vez
mais de seus funcionários a capacidade de entender o mundo ao redor, de pensar
criativamente, de criar e de agir com autonomia.
É a nossa base cultural, a permear a literatura,
a música, o cinema e o teatro, que contém os elementos para desenvolver essas
capacidades. São nossas viagens intelectuais pelo mundo das artes a nos
permitir escapar das convenções, olhar além dos lugares-comuns, fazer conexões,
pensar fora do convencional e buscar novas ideias. Quem não tem a oportunidade
de mergulhar no amálgama cultural tem menores chances de desenvolver tais
capacidades.
O brasileiro Paulo Freire chamava de “Educação
bancária” a pedagogia para a qual os estudantes são meros depositários de
conhecimentos a serem absorvidos sem análise crítica ou discussão. A Educação
bancária separa claramente educador e educando: o primeiro pensa e fala, o
segundo é pensado e escuta; o primeiro escolhe o conteúdo e o prescreve, o
segundo sujeita-se ao conteúdo e o assimila; o primeiro é o sujeito, o segundo
é objeto. Já é tempo de superá-la.
Fonte Carta
Capital